Em
30 de agosto de 1942, um oficial alemão não-comissionado,
Wilhelm Cornides, esteve em
Rzeszow, em seu caminho de trem para
Chelm.
Em seu diário ele registrou que um policial ferroviário em
Rzeszow lhe disse que "uma placa de mármore
com letras douradas será erguida em
1° de setembro,
porque então a cidade estará "livre de judeus". O policial também lhe disse que trens
cheios de judeus "
passam quase diariamente através
dos pátios de baldeação, são despachados imediatamente para seu trajeto, e retornam
totalmente vazios, com mais freqüência na mesma noite." Cerca de 6.000 judeus
de
Jaroslaw, acrescentou o policial, "
foram mortos
recentemente em um dia."
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Estação Rawa Ruska n° 1 |
Então Cornides pegou o trem regular de passageiros de
Rzeszow para
Chelm,
chegando a
Rawa Ruska em
31 de agosto, e registrando em seu diário, enquanto
esteve na "Casa Alemã" daquele local:
"
Ao meio-dia e dez minutos, eu vi um transporte de trem
correr para a estação. No teto e nos degraus sentavam-se guardas com rifles. Podia-se
ver à distância que os vagões estavam abarrotados de pessoas. Eu me virei e percorri a
pé o trem inteiro: ele consistia de 35 vagões de gado e um vagão de passageiros.
Em cada um dos carros havia no mínimo 60 judeus (no caso dos transportes de
homens alistados ou transportes de prisioneiros, esses vagões comportariam 40 homens;
entretanto, os bancos haviam sido removidos e podia-se ver que aqueles que estavam
ali trancados tinham que ficar espremidos em pé). Algumas das portas estavam um pouco
abertas, as janelas entrecruzadas com arame farpado. Entre as pessoas ali trancadas havia
alguns poucos homens e a maioria deles eram velhos; todos os outros eram mulheres,
garotas e crianças. Muitas crianças se amontoavam às janelas e às estreitas aberturas
das portas. A mais nova com certeza não tinha mais de dois anos.
Assim que o trem parou, os judeus tentaram passar garrafas para fora a fim de pegar
água. O trem, entretanto, estava cercado por guardas da SS, para que ninguém pudesse
se aproximar. Naquele momento, um trem chegou vindo da direção de
Jaroslaw; os viajantes afluíram
em direção da saída sem se preocupar com o transporte. Alguns poucos
judeus que estavam ocupados carregando um carro para as forças armadas acenaram
seus chapéus para as pessoas que estavam trancadas.
Eu conversei com um policial em serviço na estação da ferrovia. À minha pergunta
sobre de onde os judeus realmente vieram, ele respondeu:
"Aqueles são provavelmente os últimos de Lwow.
Isso tem continuado por três semanas ininterruptamente. Em
Jaroslaw eles só deixaram ficar oito,
ninguém sabe por quê."
Perguntei: "Para onde eles irão?" Então ele respondeu: "Para Belzec." "E depois?"
"Veneno." Eu perguntei: "Gás:" Ele encolheu os ombros. Então ele disse apenas:
"No começo eles sempre os fuzilavam, acredito eu."
Aqui na Casa Alemã eu só falei com dois soldados do campo de prisioneiros de
guerra da linha de frente 325. Eles disseram que ultimamente estes transportes
tinham corrido todos os dias, na maioria das vezes à noites. Acredita-se que
ontem passou um de 70 vagões."
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Estação Rawa Ruska n° 2 |
De Rawa Ruska, Cornides tomou o trem da tarde para
Chelm.
As coisas que ele aprendeu nessa jornada eram tão extraordinárias que ele fez três entradas
separadas em seu diário dentro do período de uma hora, a primeira às 17:30:
"
Quando nós embarcamos às 16:40, um transporte vazio
tinha acabado de chegar. Eu acompanhei o trem a pé duas vezes e contei 56 vagões.
Sobre as portas havia sido escrito em giz: 60, 70, uma vez 90, ocasionalmente 40 -
obviamente o número de judeus que eram carregados lá dentro.
Em meu compartimento eu falei com a esposa de um policial ferroviário que
está atualmente visitando seu marido aqui. Ela disse que esses transportes agora
estão passando diariamente, às vezes também com judeus alemães. Ontem seis
corpos de crianças foram encontrados ao longo dos trilhos. A mulher acha que os
próprios judeus tinham matado essas crianças - mas elas devem ter sucumbido
durante a viagem.
O policial ferroviário que apareceu como companhia de trem juntou-se a nós
no nosso compartimento. Ele confirmou as declarações da mulher sobre os
corpos das crianças que foram encontrados ontem ao longo dos trilhos.
Eu perguntei:
"Os judeus sabem o que vai acontecer com eles?" A mulher respondeu:
"Aqueles que vêm de longe não sabem de nada, mas aqui na vizinhança eles já sabem.
Então eles tentam fugir, se eles percebem que alguém está vindo atrás deles. Assim,
por exemplo, mais recentemente em Chelm
onde três foram fuzilados a caminho da cidade." "Nos documentos da ferrovia esses
trens rodam sob o nome de transportes de reassentamento", notou o policial da ferrovia.
Então ele disse que depois do assassinato de Heydrich,
vários transportes contento tchecos haviam passado.
O Campo Belzec deve estar localizado à direita
da linha férrea, e a mulher prometeu mostrá-lo a mim quando nós passássemos por ele.
5.40 pm. Uma parada rápida. Em frente a nós, um transporte pára novamente. Eu falo
com o policial na frente do compartimento no qual nós estamos viajando. Eu pergunto:
"Você vai voltar para casa, para o Reich?" Sorrindo, ele diz:
"Você provavelmente sabe de onde nós estamos vindo. Bom, para nós o trabalho
nunca está terminado."
Então o transporte à nossa frente vai embora, com 35 vagões vazios e limpos.
Com toda a certeza este foi o trem que eu havia visto às 13:00 na estação Rawa Ruska.
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O Abrigo da Locomotiva |
18:20. Nós passamos pelo campo Belzec.
Até então, nós viajamos por algum tempo através de uma floresta de altos pinheiros.
Quando a mulher chamou, "Agora vem!", podia-se ver uma ponta alta de pinheiros.
Um forte cheiro adocicado podia ser percebido distintamente. "Mas eles já estão
cheirando mal," diz a mulher. "Oh, bobagem, é apenas o gás", disse o
policial ferroviário rindo.
Enquanto isso - nós havíamos percorrido cerca de 200 metros - o odor adocicado
se transformava em um forte cheiro de algo queimando. "Isso é do crematório",
diz o policial. Uma curta distância adiante, a cerca acabou. Na frente dela,
podia-se ver uma casa de guarda com um posto SS. Um trilho duplo levava para dentro
do campo. Um ramal de trilhos se separava da linha principal, a outra corria sobre
uma rotunda a partir do campo para uma fileira de celeiros cerca de 250 metros
adiante. Um vagão por acaso estava sobre a rotunda. Vários judeus estavam ocupados
girando o disco. Guardas da SS, com rifles sob os braços, estavam presentes.
Um dos celeiros estava aberto; podia-se ver distintamente que estava cheio até o teto
com fardos de roupas. Enquanto prosseguíamos, olhei para trás mais uma vez.
A cerca era muito alta para se poder ver qualquer coisa. A mulher diz que às vezes,
enquanto se passa, pode-se ver fumaça subindo do campo, mas eu não percebi nada
do tipo. Minha estimativa é que o campo mede entre 800 por 400 metros."
Em seu diário, Cornides registrou conversas que teve com outras testemunhas:
"
Na noite de 30 de agosto de 1942
na 'Casa Alemã' em Rawa Ruska, um engenheiro me contou:
"Tirando os poloneses e prisioneiros de guerra, judeus, que foram os principais transportados
desde então, também foram empregados em conexão com o trabalho no solo de
exercícios eqüestres que está localizado aqui. O trabalho dessas turmas de construção
(que incluíam mulheres) atingia 30% do nível de produtividade de trabalhadores alemães
em média. Enquanto algumas pessoas recebiam pão de nós, outras tinham que
encontrá-lo por si mesmas. Por acaso, recentemente eu vi o carregamento de um
transporte desses em Lwow. Os vagões
ficavam ao pé do banco de areia. Usando paus e chicotes de cavalaria, os homens da
SS dirigiam e empurravam as pessoas para dentro dos vagões. Aquele era uma
visão que não esquecerei enquanto estiver vivo."
Lágrimas vinham aos olhos do homem enquanto ele contava sua história. Ele tinha
aproximadamente 26 anos de idade, e usava um emblema do partido. Um capataz
de construção dos Sudetos que sentava-se à mesma acrescentou:
"Recentemente, um homem SS bêbado sentou-se na nossa cafeteria, chorando feito
uma criança. Ele disse que estava servindo em Belzec,
e que se as coisas corressem desse jeito por mais 14 dias ele se mataria,
porque ele não poderia mais suportar."
Um policial no restaurante do prédio do governo em
Chelm em 1° de setembro de 1942:
"Os policiais que guardam os transportes judaicos não são permitidos dentro do campo;
somente a SS e o Sonderdienst Ucraniano (uma formação policial que compreendia auxiliares
ucranianos) eram permitidos. Por causa disso, eles criaram um bom negócio. Recentemente,
um ucraniano que esteve aqui tinha um grande maço de notas, relógios, e ouro - tudo
que se podia imaginar. Eles encontram tudo isso quando eles juntam e despacham as roupas."
Em resposta à pergunta, sobre o modo como os judeus eram mortos, o policial respondeu:
"Alguém diz a eles que eles precisam ser despiolhados. Então eles se despem e entram
numa sala na qual, no início, entra uma onda de calor, e assim eles já receberam uma
pequena dose de gás. É suficiente para agir como um anestésico local. O resto vem
em seguida. E então eles são imediatamente queimados."
Quanto à questão de por que toda essa ação era executada, o policial declarou:
"Até agora, os judeus foram empregados em todo o lugar pela SS e pela Wehrmacht,
etc., como trabalhadores auxiliares. Naturalmente, eles ouviram um monte de coisas,
e além disso eles relataram tudo aos russos. Com tudo isso, eles têm que ir. E então eles
também operavam todo o mercado negro e manipulavam os preços aqui. Quando os
judeus se forem, os preços podem novamente se tornar razoáveis."
Fontes:
Gilbert, Martin.
Final Journey: The Fate of the Jews in Nazi Germany, Mayflower Books, New York, 1979
Longerich, Peter.
Die Ermordung der europäischen Juden. Serie Piper 1060, München, 1989